quinta-feira, 17 de maio de 2012

Altitude

Os alpinistas, trekkers e todos aqueles que se aventuram a subir a altitudes elevadas convivem, todo o tempo, com uma perigosa ameaça conhecida por AMS (acute mountain sickness) ou, em português, o mal agudo das montanhas.

O AMS é um problema causado pela escassez de oxigênio nas grandes altitudes, impossibilitando que o organismo capte o oxigênio necessário para suprir suas necessidades básicas, o que acaba resultando em uma série de efeitos no organismo.Esta afecção resulta da falta de aclimatação e acomete uma porcentagem grande de montanhistas, e quando não é tratado, pode provocar edema pulmonar ou cerebral, podendo levar, inclusive, à morte.

Os primeiros sinais da altitude costumam se manifestar em altitudes em torno de 3.500 metros, no entanto, podem aparecer em altitudes inferiores, variando de acordo com o organismo de cada pessoa. 
Outro aspecto da AMS é que ela pode se manifestar em um montanhista que já realizou a mesma escalada diversas vezes, sem ter tido qualquer sintoma anteriormente. Ou seja, cada subida é uma subida, e você precisa estar sempre atento à reação do seu organismo naquele momento.As altitudes, para os efeitos da AMS, dividem-se em três categorias:
  • Moderadas: entre 2.400 a 3.600 metros;
  • Altas: entre 3.600 a 5.400 metros;
  • Extremas: superior a 5.400 metros.


O gráfico mostra o perfil de variação de altitude que enfrentaremos até o Acampamento Base do Everest, quando poderemos chegar ao limite de 5.545 metros no topo do Kala Phatar. Acima disso, o bicho pega. Além disso, em altitudes extremas os helicópteros estão impedidos de voar devido à falta de sustentação no ar rarefeito, o que dificulta, ainda mais, um resgate de emergência.

O mal das montanhas acomete pessoas que moram ao nível do mar e que sobem a uma altitude moderada, em 1 a 2 dias. Isto resulta na falta de ar, aumento do ritmo cardíaco e consequente cansaço. Aproximadamente 20% dos indivíduos sentem dores de cabeça, náuseas, vômitos e insônia. Imagine passar o dia inteiro de ressaca sem ter bebido no dia anterior!A maior parte das pessoas recupera-se dentro de poucos dias. Esta perturbação tem uma maior prevalência entre os jovens, do que entre as pessoas mais velhas, o que nos coloca em uma certa desvantagem  :)

O melhor jeito de prevenir o mal das montanhas é subir vagarosamente para permitir a aclimatação do organismo, demorando pelo menos dois dias para alcançar os 2.500 metros de altitude, e um dia a mais para cada 350 a 700 metros adicionais. Pernoitar no caminho também ajuda a reduzir os riscos.Ao longo de nossa trilha ao Everest planejamos duas escalas de aclimatação. A primeira em Namche Bazaar e a segunda em Dhugla ou Pheriche. Nas escalas de aclimatação passaremos duas noites consecutivas dormindo no mesmo local (e na mesma altura, claro), para que o corpinho vá se acostumando a viver sem tanto oxigênio.

Para auxiliar o processo de aclimatação à altitude a maioria dos escaladores e trekkers adotam a pratica de subir mais durante o dia mas retornar a uma altitude mais baixa para passar a noite (climb high, sleep low). Assim, no nosso dia de "folga" para aclimatação,em Namche Bazaar, talvez façamos uma escaladinha ao Khumjung, em ritmo de bate e volta.Essa rotina é repetida algumas vezes, cada vez aumentando o tempo gasto em altitudes mais elevadas para permitir o corpo se ajustar ao nível de oxigênio, um processo que envolve na produção de novos glóbulos vermelhos

Este processo não pode ser apressado, e é por isso que os alpinistas precisam passar dias (ou mesmo semanas) para se aclimatizarem antes de tentar escalar um alto pico.Os sintomas são minimizados com o uso de pequenas doses de acetazolamida no começo da subida e alguns dias após a chegada ao destino. O Diamox é um item fundamental na mochila de um trekker ou alpinista. O frasco da foto é o nosso.
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Ao sentir os sintomas primários de AMS, existem três regras de ouro para evitar que a coisa se complique e fique grave:

  • 1ª: Descer,
  • 2ª: Descer, e
  • 3ª: Descer
Existe ainda uma quarta regra e a mais importante para não se tornar uma vítima do mal da altitude: ser honesto consigo mesmo, reconhecer as suas limitações naquele momento e humildemente retroceder.

Nas montanhas, voltar não significa derrota. Recuar é parte da estratégia de preparação para um novo ataque às alturas quando seu organismo estiver suficientemente aclimatado e forte para a conquista. A verdadeira vitória não se resume em alcançar o seu objetivo a qualquer custo, mas sim, atingir o limite que a montanha permitir e descer com vida. 

No milenar livro A Arte da Guerra, Sun Tzu diz que velocidade não significa pressa, e uma preparação completa se faz necessária para que se obtenha a vitória; e cita o I Ching que diz: "É má fortuna teimar diante de circunstâncias insuperáveis." Além disso, enquanto a formulação da estratégia depende de uma inteligência prévia, é também imperativo adaptar-se às situações reais da batalha. Como afirma o I Ching: "Chegando a um impasse, muda; depois de mudar, podes prosseguir." . Nas montanhas também é assim...

Um comentário:

  1. Quem quase teve um ataque cardíaco agora fui eu! Manchete do twitter da Veja: 3 alpinistas estrangeiros morrem no Everest. Até abrir a matéria... Mas eles estavam a mais de 8mil metros hehehe
    Beijinjos

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